Introdução
Sabe-se que o câncer do colo do útero é o terceiro mais comum entre as mulheres em todo o mundo, muitas das quais ainda estão dentro de sua expectativa de vida reprodutiva (1). A triagem cervical para identificação precoce e tratamento da neoplasia intraepitelial cervical reduz a incidência e a mortalidade por câncer do colo uterino (2). A terapia tradicional para a doença em estágio inicial é a histerectomia radical com linfadenectomia pélvica, o que leva à infertilidade. Nos últimos 20 anos, terapias poupadoras de fertilidade, como a conização cervical e a traquelectomia radical, surgiram e mostraram bons resultados oncológicos e obstétricos (3). A traquelectomia radical é um procedimento promissor para preservar a fertilidade para câncer cervical em estágio inicial, no entanto a estenose ístmica ocorre em cerca de 15% dos pacientes que receberam a traquelectomia radical e é uma das principais causas de infertilidade, podendo causar distúrbio menstrual, hematometria e dores abdominais. A dilatação ístimica é o tratamento, porém a recanalização frequentemente falha. Se a dilatação ístmica for bem-sucedida e a permeabilidade das membranas for obtida, a inseminação intrauterina é a melhor e mais rentável escolha em pacientes com tubas uterinas e/ou infertilidade com fator masculino leve. A inseminação intraperitoneal direta pode ser escolhida como tratamento de primeira linha em pacientes com estenose ístmica recorrente ou não-resolvida, onde a permeabilidade das trompas foi confirmada, não existem defeitos de contorno intrauterino, e não há infertilidade profunda em fator masculino (4). A excisão cervical remove parte do canal endocervical e consequentemente o muco endocervical que facilitam a penetração do espermatozoide e da concepção. Isso tem afetado negativamente as chances de concepção devido a perda da estrutura cervical funcional normal e o processo e cicatrização do epitélio regenerado após excisão, podendo causar estenose grave do orifício cervical, o que pode inibir ainda mais a penetração e a concepção espermática (2).
Objetivo
Avaliar a relação entre conização e infertilidade.
Métodos
Pesquisa de estudos na base Medline, por intermédio do PubMed.
Resultados
Segundo artigo de revisão publicado pela Associação de Cirurgia Oncológica Indiana em 2015 as complicações da conização a longo prazo incluem infertilidade devido a estenose cervical e deficiência do muco cervical. Devido ao encurtamento do colo também pode ocorrer trabalho de parto prematuro e ruptura prematura de membranas (4). Artigo publicado pela Fertility and Sterility em 2016 relata que a principal causa de infertilidade após cirurgia poupadora para câncer cervical invasivo está relacionada a fatores cervicais: falta de muco cervical para facilitar a migração de espermatozoides, endometrite subclínica aumentada e estenose cervical (5). Conforme artigo publicado pelo Departamento Médico e Ginecologia Oncológica do Canadá em 2014 cita algumas complicações após traquelectomia/conização tais como estenose ístmica (10% a 15% dos pacientes), e consequentemente amenorréia secundária, dor pélvica, hematometra, hematossalpinge e endometriose pélvica. Outra complicação citada é o hematoma de parede vaginal e proeminência dos plexos venosos pélvicos podendo causar dores pélvicas (1). O Jornal Europeu de Câncer 2015 também refere a estenose cervical como causa potencial de infertilidade e aumento do uso de tecnologia reprodutiva artificial, além disso a mesma pode levar amenorréia, dismenorréia, hematometra e endometriose.Em casos mais extremos, o sistema pode ser completamente obliterado o que dificulta a passagem do esperma, além disso, o muco facilita a migração de espermatozoides no útero, falta do mesmo devido a remoção do colo do útero promove alteração do caráter físico afetando a fertilidade (6).Caso descrito pelo Divisão de Reprodução Endocrinológica e Infertilidade da USA em 2014 e caso reportado pelo Departamento de Ginecologia e Obstetrícia do Canadá 2009 relatam que a transferência transmiometrial de embriões representa uma opção viável para pacientes com estenose cervical refratária ou há distorção anatômica severa do canal cervical, na qual a transferência de embrião transcervical não é possível (7,8). Caso reportado pela Fertility and Sterility em 2007 é discutido o uso de stent de plástico no canal cervical após dilatação para prevenir recidiva de estenose pós-operatória, no entanto, esses stents devem ser removidos após 1 ou 2 semanas (9). O Journal of Minimally Invasive Gynecology da Turquia 2005 relata que a dificuldade de transferência de embriões devido à estenose cervical estão associados a menor chance de gravidez após procedimentos reprodutivos e a revisão histeroscópica do canal cervical resulta em facilidade de realização de transferência embrionária e melhora as taxas de gravidez em pacientes com estenose cervical e histórias de transferência embrionária difícil (10).
Conclusão
A cirurgia preservadora da fertilidade para tratar o câncer de colo uterino tem bons resultados oncológicos e obstétricos e está se expandindo, porém, a excisão cervical remove parte das glândulas endocervicais que facilitam a penetração do espermatozoide, além disso pode gerar estenose cervical afetando negativamente as chances de concepção.
Referências bibliográficas
(1) Faber-Swensson A. P., Perrin L. C., and Nicklin J. L., “Radical Trachelectomy for early stage cervical cancer: the Queensland experience,” Australian and New Zealand Journal of Obstetrics & Gynaecology, vol. 54, no. 5, pp. 450–452, 2014
(2) Kyrgiou, M. et al, Fertility and early pregnancy outcomes after conservative treatment for cervical intraepithelial neoplasia. Cochrane Database Syst. Rev. 2015;9:CD008478.
(3) Choi, S.Y., Lee, K.H., Suk, H.J., Chae, H.D., Kang, B.M., Kim, C.H. Successful pregnancy by direct intraperitoneal insemination in an infertile patient with failure of recanalization of isthmic stenosis after laparoscopic radical trachelectomy. Obstet Gynecol Sci. 2014;57:82–85.
(4) Rema P, Ahmed I. Conservative surgery for early cervical cancer. Indian J Surg Oncol 2016;7:336–340.
(5) Bentivegna, E., Maulard, A., Pautier, P., Chargari, C., Gouy, S., Morice, P. Fertility results and pregnancy outcome after conservative treatment of cervical cancer: a systematic review of the literature. Fertil Steril. 2016;106:1195–1211.
(6) Li, X., Li, J., Wu, X. Incidence, risk factors and treatment of cervical stenosis after radical trachelectomy: a systematic review. Eur J Cancer. 2015;51:1751–1759.
(7) Sullivan-Pyke CS, Kort DH, Sauer MV, Douglas NC. Successful pregnancy following assisted reproduction and transmyometrial embryo transfer in a patient with anatomical distortion of the cervical canal. Syst Biol Reprod Med. 2014;60:234–238. doi: 10.3109/19396368.2014.917386.
(8) Jamal, W., Phillips, S.J., Hemmings, R., Lapensée, L., Couturier, B., Bissonnette, F. et al, Successful pregnancy following novel IVF protocol and transmyometrial embryo transfer after radical vaginal trachelectomy. Reprod Biomed Online. 2009;18:700–703.
(9) Grund D, Kohler C, Krauel H, Schneider A (2007) A new approach to preserve fertility by using a coated nitinol stent in a patient with recurrent cervical stenosis. Fertil Steril 87:1212.e13–1212.e16
(10) Pabuccu R, Ceyhan ST, Onalan G, Goktolga U, Ercan CM, Selam B. Successful treatment of cervical stenosis with hysteroscopic canalization before embryo transfer in patients undergoing IVF: a case series. J Minim Invasive Gynecol 2005; 12 (5) 436-438